A
teor do art. 1.196 do Código Civil de 2002, considera-se possuidor todo aquele
que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.
No caso, esses direitos são de uso, gozo, disposição e o de reaver a coisa de
quem injustamente a possua.
Ocorrendo
esbulho, turbação ou ameaça à posse, o possuidor poderá manejar ação de
reintegração, manutenção e interdito proibitório, respectivamente.
Não
há dúvidas, pois, que a legislação pátria confere o direito de recuperação da
posse ao possuidor. E, evidentemente, eventual ordem judicial de desocupação,
esta poderá ser auxiliada por força policial.
Deu-se,
que, na data de 10/01/2017 (terça-feira), foi erguida uma força-tarefa para dar
cumprimento à reintegração de uma propriedade pertencente à família do falecido
JOÃO DOS SANTOS, um magnata pernambucano, cujo império chegou a ser comparado
ao de ninguém menos que Odebrecht e do Grupo Queiroz Galvão.
Tal
empenho não causaria a menor perplexidade, não fosse pelo momento que está
vivendo a Polícia Militar de Pernambuco: uma forte crise pela reivindicação de
direitos e melhores condições de trabalho, batalha que rende penosas quedas de
braço entre policiais e Governo, a qual resultou na recusa de policiais em
praticarem jornadas extras, as quais, por seu caráter voluntário, exercido na
folga do PM, não podem ser impostas coercitivamente, mas que, por outro lado,
não tiradas, reduzem o efetivo policial no Estado em quase 50%, dada a
defasagem que apresenta o efetivo.
Sendo
assim, podemos concluir que, diante da formação de uma operação dessa monta, a
qual envolveu diversos segmentos da Segurança Pública: BPRv, K9 (Canil),
CIPOMA, GATI, Batalhão de Área, CHOQUE, Cavalaria, Bombeiro, Samu, com direito
a mega estrutura formada por tendas, trailers, banheiros químicos, tratores,
reboques, ônibus, etc, restou prejudicada a sociedade, ainda mais desprotegida
com a recondução do pouco policiamento que consta em serviço para o
acompanhamento da reintegração da posse de uma propriedade.
Como
explicamos antes, interesse
público é o interesse da coletividade, do grupo social como um todo.
Entretanto, não existe preponderância de direitos. Tanto, que DI PIETRO traça
um importante paralelo sobre o PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO e
os DIREITOS INDIVIDUAIS:
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Em verdade, os que se opõem à aplicação
do princípio da supremacia do interesse público partem de uma errônea
interpretação de seu significado. Dão a ele uma generalização que jamais
existiu, pois é evidente a impossibilidade de, em qualquer situação de conflito
entre o público e o privado, fazer prevalecer o primeiro; se assim fosse,
realmente não haveria como garantir os direitos individuais.
Mas também não se pode esquecer que não
existe direito individual que possa ser exercido de forma ilimitada.
Praticamente todos os direitos previstos na Constituição sofrem limitações que
são impostas pelo ordenamento jurídico, precisamente para definir os seus
contornos e impedir que o seu exercício se faça em prejuízo dos direitos dos
demais cidadãos e da coletividade.
(DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito
administrativo, 27ª ed., São Paulo: Atlas, 2014, págs. 36/37).
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Temos,
pois, de um lado, a sociedade, e seu direito à segurança pública, e o
particular, com direito à proteção do direito de propriedade.
Havendo
colisão ou conflito de princípios e regras, há de se adotar o critério da
ponderação de valores. Preceitua DIRLEY DA CUNHA JUNIOR sobre o princípio da
razoabilidade:
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A razoabilidade, ou proporcionalidade
ampla, portanto, possui uma tríplice exigência, que se expressa através dos
seguintes subprincípios:
Adequação (ou Utilidade)
- É aquele que exige que as medidas adotadas pela Administração Pública se
apresentem aptas para atingir os fins almejados. Ou seja, que efetivamente
promovam e realizem os fins. Ora, fere até o bom senso que a Administração
Pública possa se valer de atos e meios, ou tomar decisões, que se revelem
inúteis a ponto de não conseguirem realizar os fins para os quais se destinam.
Necessidade (ou Exigibilidade) - Em razão deste subprincípio, impõe-se que a Administração
Pública adote, entre os atos e meios adequados, aquele ou aqueles que menos
sacrifícios ou limitações causem aos direitos dos administrados. Por este
subprincípio objetiva-se evitar o excesso da Administração.
Proporcionalidade em sentido estrito - Em face deste subprincípio, deve-se encontrar um
equilíbrio entre o motivo que ensejou a atuação da Administração Pública e a
providência por ela tomada na consecução dos fins visados. Impõe-se que as
vantagens que a medida adotada trará superem as desvantagens.
Enfim, faltando qualquer um desses
requisitos o ato não será razoável, nem proporcional, expondo-se à invalidação
(CUNHA JR, Dirley da. Curso de Direito
Administrativo, 14ª ed, Salvador: Jus Podivm, 2015, pág. 51).
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Não
nos parece, pois, razoável, que a PMPE desloque significativo efetivo à
efetivação de uma reintegração de posse particular, quando a sociedade
encontra-se já desfalcada de Segurança Pública.
Entendemos
que houve determinação judicial, mas temos certeza de que nenhum magistrado,
sendo formalmente cientificado da limitação da PMPE, imporia tal incumbência à
Administração Pública. Certamente, atendendo ao princípio da razoabilidade,
determinaria que a medida fosse efetivada quando a situação frente à Operação
Padrão fosse regularizada.
É
o nosso modesto entendimento.
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